(O que estudar em História? - Parte 1)
Gostaria de abrir um parêntese
Essa semana foi levantada uma questão importante, que deve estar passeando pela cabeça de muitos nesse momento: Tá, muito legal tudo isso aí, claro, mas e o vestibular? O que vai cair? Como estudar? Que períodos, datas e autores?
Calma. Primeiro, é importante saber que alguns temas são mais recorrentes do que outros, mas que tirar personagens dos seus contextos ou (muito pior!) trazer o nosso século até o universo deles é um vício muito tentador, a que devemos nos atentar.
Por exemplo, alguns temas, como a Revolução Francesa, são importantíssimos. Relacionar a França de Robespierre com a França dos dias de hoje, por sua vez, é traçar um paralelo de três séculos. Não dá pra fazê-lo com tanta simplicidade ou com a mesma ótica com que olhamos para os nossos congressistas, por exemplo, mesmo que tenhamos vontade de testar a guilhotina também neles. No entanto, alguns fenômenos atuais tem suas raízes, se assim pudermos chamar, nas épocas e eventos passados. Alguns desses eventos merecem destaque pelo impacto que tiveram, a saber:
Pré-História: É relativamente mais raro, mas algum vestibular maroto pode querer saber como foi que o homem teve, em bando, a ideia de cultivar a terra, que era mais fértil entre os rios. O fogo era também muito importante, mais ainda os objetos que ele forjava e o que se podia fazer com eles.
Péricles, pai da democracia. Vivem tentando fardá-lo! |
Antiguidade Clássica: Leia-se antiguidade do mundo antigo ocidental, ou melhor, Grécia e Roma. Conceitos importantes que hoje permeiam a nossa sociedade foram lançados nesse período, como democracia, república, direito, senado, plebe e particularmente a filosofia comunitária que tem regido a sociedade ocidental a grosso modo desde então, o cristianismo.
Agora imaginem este último: Ele mudou muito nesses últimos dois mil anos, não foi? Da mesma forma, todos os os demais passaram por profundas alterações. Entender como eles se formaram é uma coisa e como eles evoluíram é outra totalmente diferente. Nesse ponto, tentem focar no primeiro aspecto e principalmente imaginar como algumas instituições como imperadores, presidentes e magistrados que vieram depois se apropriaram deles.
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O que o Orlando Bloom foi fazer em Jerusalém? |
O medievo: Este é fácil, não é: Rasgaram tudo aquilo que havia antes e mergulharam nas trevas, não? Não. Embora seja muito tentador tratar os medievais como os ignorantes que viveram entre os gregos e os franceses, esse sistema tinha suas próprias características e também a sua produção científica, embora ela fosse totalmente concentrada nos muros dos conventos. Lembrem-se de Carlos Magno, rei que tornou a França católica e unificada.
Aliás, concentração é uma palavra crucial nesse período: De saber, fé, terras e, aos poucos, de poder e riqueza. Tentei enfatizar esse último conceito na primeira aula pois ele foi amplamente aprimorado nesse período por uma classe emergente, os burgueses. Como vimos, o comércio renasceu no final desse período e o mundo foi descobrindo que havia mais do que guerrear, plantar e rezar. Novamente é necessário ressaltar: O mundo oriental não entra nessa visão. Pode parecer invertido, mas os europeus estavam ocupados em justificar a religião enquanto os orientais produziam as grandes inovações desse período e quase conquistaram a Europa, não fossem os reis católicos dos portugueses, espanhóis e francos. Como as sociedades islâmica, da indiana e chinesa, basta lembrar a sanha que os europeus tinham por esses produtos de lá e como a busca por elas vai ser o combustível para a expansão da Europa.
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Não nos cansamos de reler a Gioconda. |
Renascimento: Possui várias facetas, não só a cultural: foi também comercial, urbano e filosófico, e está totalmente amparado nos acontecimentos do final da idade média, não sendo um estalo de sabedoria nos homens. Aliás, o humanismo é talvez a contribuição mais relevante desse período: Filosoficamente o homem (e nem todo mundo o era) voltou a ser o foco das sociedades, ao mesmo tempo que cientificamente deixou de ser o centro do universo, o que mostra o quanto ainda se havia a descobrir. Quantos pintores, astrônomos, artistas, teóricos e moralistas foram importantíssimos para as sociedades dessa época, sobretudo os que mais souberam transitar entre as áreas de expansão do saber, como Da Vinci, financiado é claro pelo burguesia próspera e pela Igreja, que também moralmente desceu dos céus à terra. Lembrem-se que Portugal também teve sua participação importante na expansão do mundo cristão, como bem sabemos.
Absolutismos: Por mais estranho que pareça, as bases do renascimento foram as bases do Estado Absoluto. As mudanças no modo de produzir do continente durante período foram as forças motrizes para a criação de estados fortes que pudessem ser os agentes que pudessem manter e expandir esse processo, regulando também o seu funcionamento. E não pensem que foi apenas uma imposição: Há uma série de teóricos e filósofos que pensaram numa sociedade que se regula sozinha, mas que contava com um grande irmão forte e vigilante, dotado de escudo e espada e comandado por um número de famílias que na Europa se podia contar nos dedos. Obras como O Leviatã, de Tomas Hobbes, vão exatamente a esse encontro.
O rei no alto inspira o povo à volta. Nesse caso, é a estátua do Marquês. |
Isso sintetiza também a criação do conceito de liberalismo, que pouco implica liberade, mas em garantias, também se enquadra nesse período, embora também tenha mudado e sido reapropriado muito desde então. Quanto aos estados, a França é o estado de maior destaque desse período e o principal afluxo de riquezas e ideias, casa de autores como Rousseau (sobre o homem que na natureza era bom, foi encontrado aqui na América e apresentado aos males da sociedade), Jacques Bossuet (o direito dos reis em governar vem de Deus) e Voltaire (o governante deve ser absoluto, esclarecido e reformista). Também a Inglaterra é importante, primeiro com uma reação absoluta capaz de organizar o estado, seguido de rompimento com a fé católica (Anglicanismo) e depois tornando o rei figurativo, na Revolução Gloriosa, a partir da qual passou a concentrar o poder no parlamento, assembleia representativa tanto de comuns quanto dos lordes, e a buscar escrever seu próprio contrato social (como em John Locke). A França fará esse rompimento com sangue (Parte 2).
Portugal nesse contexto era uma nação absoluta, mas abençoada, e mais expunha do que explicava. O Marquês de Pombal é um parêntese nesse sentido, vale a pena ver o que ele fez lá e como refletiu aqui.
Em postagens futuras vou comentar um pouco mais sobre os assuntos seguintes. Vai chegar a nossa vez aqui na América de entrar na História, e as cabeças serão despidas de coroas. Tudo a seu tempo.
Até quinta-feira!
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